segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

A volta dos gauleses

Alonso e Flavio Briatore, chefão da Renault: acordo firmado (foto: Motorsport)

Por Otto Jenkel

Acabou. Depois de tantas especulações, Fernando Alonso acabou tomando a decisão mais provável e a menos arriscada: voltar à Renault, equipe em que foi bicampeão mundial em 2005/2006. O veredicto do espanhol acabou decepcionando algumas pessoas que esperavam uma decisão mais ousada. Pode ser. Mas não resta dúvida que, colocadas as opções na mesa, o retorno à equipe francesa seria a mais viável. Algumas dessas, aliás, beiravam o absurdo.

Duas foram muito cogitadas: ter um ano sabático, ou seja, retirar-se por um ano, e voltar numa equipe mais forte, leia-se Ferrari, em 2009. Em primeiro lugar, se ausentar durante um certo período é sempre um risco. O piloto perde o contato com as inovações técnicas e, além disso, tem uma perda de habilidade motora e física, que só a disputa de corridas regulares pode suprir. Muitos falam que Alain Prost - que se retirou em 1992 para retornar à F1 pela Williams no ano seguinte e ser o campeão - seria um bom exemplo. Nada mais falso.

A equipe inglesa era muito superior às demais na época, mas ficou evidente que, mesmo sendo campeão, o francês já não era o mesmo piloto. Tanto que, embora ele tenha se retirado definitivamente no final de 1993, com o título e sete vitórias, todas as glórias ficaram para Ayrton Senna, que conseguiu inacreditáveis cinco vitórias com um McLaren nitidamente inferior, no que é considerado o maior vice-campeonato da história.

Tão absurda como essa hipótese foi a que surgiu na última semana, quando colocaram Alonso de volta à McLaren. O motivo: os dois principais patrocinadores da equipe de Wöking - Vodafone e Santander - serem espanhóis e não terem engolido o seu compatriota ser alijado da equipe. É provável que eles não tenham gostado. Certo até. Mas depois de tudo que aconteceu esse ano, não haveria a menor hipótese de uma reconciliação entre Alonso e a cúpula da McLaren, qualquer que fosse o patrocinador.

As outras possibilidades para o espanhol envolviam uma boa dose de risco. Desembarcar na Red Bull, Honda, Toyota ou BMW. Não se sabe até que ponto houve interesse de uma dessas equipes em ter os serviços do espanhol em 2008, talvez nunca se saiba. Mas é certo que houve um affair entre alguma(s) e Alonso. Não é todo ano que um piloto do quilate do espanhol fica dando sopa no fim de uma temporada. No fim de 1983, Alain Prost foi despedido da Renault, e Ron Dennis não pensou duas vezes em mandar embora John Watson e colocar o francês em seu lugar para fazer companhia a Niki Lauda, no que seria uma das maiores duplas da história da F1. Começava então uma Era de ouro para a equipe inglesa.

Mas os tempos são outros. Das opções, fora Renault, todas seriam mais ou menos arriscadas. Talvez a mais interessante fosse a da BMW, que surgiu como a terceira força da temporada de 2007. No entanto, existe uma política nacionalista dentro da equipe que favorece os pilotos alemães (como Heidfeld e Vettel) ou com histórico no automobilismo germânico (que é o caso de Kubica). Talvez nunca tenha existido sequer uma proposta para o espanhol vindo dos alemães. Seria a melhor proposta, se ela tivesse acontecido.

As outras hipóteses envolviam um processo de recuperação de equipes que perderam o bonde da história, como Toyota e Honda, e outra que ainda precisa se firmar como uma equipe de fato da F1, como é o caso da Red Bull, que parece ainda se preocupar mais em festas e eventos do que em resultados em pista. O risco para o espanhol seria altíssimo se a decisão caísse em qualquer dessas equipes. A Renault seria a decisão natural, como acabou sendo.

A pergunta que fica agora é: será que Alonso é candidato ao título em 2008? Numa primeira análise, não. A equipe francesa não ganhou sequer uma corrida este ano, e pior do que isso, ficou em um patamar muitíssimo inferior tanto à Ferrari quanto à Mclaren. Mas voltemos a 2005. Alguém poderia imaginar no início daquela temporada que a Renault seria a campeã? Ela venceu uma única corrida em 2004, no sempre imprevisível GP de Mônaco, quando Jarno Trulli fez a corrida de sua vida. No resto, foi engolida pela Ferrari, que ganhou 15 dos 18 GPs da temporada. Em poucos meses de intervalo de um ano para o outro, tudo mudou. Nem sempre a história se repete, e a tarefa do espanhol não será nada fácil. Mas seria prematuro descartá-lo como um aspirante ao título.

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O sobrenome Piquet volta à F1 depois de 17 anos de ausência. Nélson Ângelo Piquet foi confirmado como piloto da Renault para a temporada de 2008 desbancando Giancarlo Fisichella e Heikki Kovalainen, os outros postulantes à vaga. Nelsinho se tornou o primeiro piloto brasileiro a correr na equipe francesa na história da F1, e o terceiro que representará o país no Mundial que se inicia em março, com o GP da Austrália.

Mal a notícia foi divulgada, a mídia brasileira já bombardeou o público com duas afirmações completamente distintas. A primeira é a de que Nelsinho não terá a menor chance na Renault tendo Alonso como companheiro de equipe. E a outra diz o contrário, que ele pode se tornar uma nova pedra no sapato do espanhol como foi Lewis Hamilton na McLaren. Qual será o peso dessas duas afirmações? Esse será o tema da próxima coluna.

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Depois de um ano terrível em que a melhor colocação foi um segundo lugar conseguido, por acaso, no conturbado GP do Canadá, com Kovalainen, a Renault teve essa semana o seu melhor momento de toda a temporada. Flávio Briatore ao anunciar a volta de Fernando Alonso à equipe francesa e a contratação de Nelsinho Piquet como companheiro do espanhol, voltou aos holofotes, um lugar que ele sempre gostou de estar. Em uma só cartada, ele juntou a experiência de um bicampeão do mundo com a juventude de uma futura promessa. Uma tacada de mestre. A Renault de mera coadjuvante em 2007, passa a ter uma das duplas mais interessantes para a próxima temporada. Os gauleses estão de volta.

Otto Jenkel trabalhou no FOCA TV, cobrindo o GP do Brasil, quando a prova era disputada no Rio. Acompanha Fórmula 1 desde meados da década de 70, "quando a F1 era perigosa e o sexo seguro, hoje inverteu". Leia sua última coluna sobre automobilismo clicando aqui.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Show me the money!

Boras, o negociador mais odiado da MLB, é homenageado no cartaz

Por Fernando Andrade

Certamente, quem viu o filme Jerry Maguire conhece a frase “Me mostre o dinheiro!”, tão gritada por Rod Tidwell (Cuba Gooding Jr.) para seu agente, Maguire, interpretado por Tom Cruise. Se jogasse beisebol, Tidwell não teria dúvidas sobre quem contratar para defender seus interesses.

Como sempre acontece entre as temporadas de qualquer esporte, as negociações seguem fortes no beisebol americano, mas um dos nomes mais comentados, e odiados, não é de um jogador, mas do agente Scott Boras que, entre outras coisas, foi o responsável pela decisão do terceira base Alex Rodriguez, que optou por encerrar seu contrato com os Yankees três anos antes do previsto, tornando-se um free agent.

Muitos os criticam, dizendo que Boras fez o beisebol um esporte pior. Obviamente, se referem ao fator econômico, já que o agente super-inflacionou o mercado do beisebol, com suas altas exigências e contratos que, para muitos clubes, tornam-se intangíveis. Como diz o slogan em seu site na internet, a Boras Corporation está sempre “Servindo os Atletas do Beisebol”. Ao lado disso, está sempre irritando os proprietários dos clubes da Major League.

Ninguém é ingênuo a ponto de acreditar que Scott Boras lutaria tanto por seus clientes, se não fosse receber polpudas comissões todas as vezes em que concluísse uma negociação. Até aí, não vejo problema nenhum. Afinal, os jogadores são atletas profissionais e podem lutar para ter contratos melhores. Assim como os agentes que os representam têm direito a lutar por melhores valores de contratos e, conseqüentemente, maiores comissões. Afinal, eles também têm família, por mais que alguns pareçam não ter mãe.

Apesar de considerar justo que um representante de jogadores lute para dar mais dinheiro a seus clientes, a ganância de Scott Boras parece não ter limites. Mais que isso, extrapola o mundo do beisebol.

Fazendo pesquisa para escrever essa coluna, descobri uma estória que, se verídica, é para revoltar qualquer pessoa, exceto Scott Boras, claro!

De acordo com algumas páginas da internet, em 2004 Boras teria pedido 35 milhões de dólares para ajudar Danny Corgin, um garoto de oito anos que se afogava no mar perto da casa do agente, em East Hampton, no estado de Nova Iorque.

A criança nadava em uma praia particular quando foi pego por uma correnteza e começou a se afogar. Enquanto o garoto chorava desesperado por socorro, Boras relaxava em seu iate e, ao escutar os apelos da avó do garoto, Scott Boras recusou a acudir o menino, a menos que a avó aceitasse sua proposta.

Por fim, o garoto foi resgatado por um barco de pesca que se aproximou para ajudá-lo, uma vez que o proprietário do iate mais próximo não conseguiu a merreca que pediu para evitar que Danny morresse afogado.

Depois, para seu grupo de amigos, Scott Boras explicou que não deixaria o garoto morrer afogado, mas que estava apenas exercitando o bom senso de negociador. Além disso, se disse muito decepcionado a avó da criança, que se recusou a pagar o valor pedido por ele. Afinal, “quanto vale a vida de uma criança de oito anos”?

Não sei se essa estória é verdadeira ou não, mas, a julgar pela fama de Scott Boras, não duvido dela.

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Em tempo, desculpem-me por minha ausência nas últimas semanas, mas o gênio que vos escreve deletou o Office por engano.

sábado, 8 de dezembro de 2007

Fim de uma novela, começo de outra

Varejão: lua-de-mel com a torcida pode ter terminado (foto: AP/Mark Duncan)

Por Marcelo Monteiro

Fim da novela. Uma novela marcada por muita discussão, brigas, um suposto vilão a impedir o “casamento”, flertes com outros “amores”, blefes, emoção, reviravoltas e, no fim, os dois protagonistas terminam juntos, felizes para sempre. Felizes? Para sempre?

Anderson Varejão e Cleveland Cavaliers discutiram por meses a renovação do contrato do jogador. Aparentava ser uma negociação simples. O clube estava satisfeito com o atleta, que parecia também demonstrar alegria em jogar pelo clube, e a torcida queria sua permanência. Mas o dinheiro entrou na jogada e “contaminou” a relação que parecia ser um conto de fadas.

Contratado pelo brasileiro, o agente Dan Fegan, detestado pela maioria dos dirigentes de times da NBA, teria feito um pedido inicial de US$ 52 milhões por seis anos de contrato (8,6 milhões por temporada), segundo a imprensa dos EUA. O Cleveland achou a proposta absurda e ofereceu US$ 32 milhões por cinco anos (6,4 milhões por temporada). Foi a vez de o brasileiro rejeitar. Depois, o Cavs acenou com US$ 1,2 milhão por uma temporada. Pouco mais do que Varejão embolsou na temporada passada (US$ 945 mil). Também recusada.

Quando já se comentava nos EUA que o brasileiro iria recorrer a um tribunal para tentar se livrar do Cleveland, surgiu a esperança: na terça-feira, dia 4, o Charlotte Bobcats apresentou uma proposta de US$ 17 milhões por três anos (5,6 milhões por temporada), com a possibilidade de o jogador ser liberado do clube após o segundo ano de contrato. Varejão topou.

Pelo fato de o ala-pivô ter passe livre restrito, o Cleveland tinha o direito de igualar a oferta e ficar com o jogador. Tinha uma semana para decidir. Precisou apenas de um dia: aceitou pagar o valor, com a mesma cláusula de liberação.

Quem saiu vencedor da negociação? Na minha opinião, nenhuma das partes. O Cleveland Cavaliers vai pagar menos do que chegou a oferecer ao jogador, mas terá “sob controle” um atleta de muito potencial por apenas duas temporadas.

Varejão passa a ter um ótimo salário (o mesmo de Leandrinho no Phoenix) e poderá aumentá-lo daqui a dois anos, se mostrar evolução, o que é provável. Vai jogar em um elenco bem melhor que o do Charlotte, onde certamente comemoraria um número bem menor de vitórias. Mas o desfecho não deve ter lhe agradado. Afinal, ele disse que gostaria de jogar em uma outra equipe. Fora isso...

Se não houve vencedor, pode-se se dizer que alguém perdeu? Para essa resposta, marcaria um X em uma das alternativas: Anderson Varejão perdeu mais com a novela.

Sua imagem com a diretoria do clube, com os demais jogadores do Cavs e com a torcida está seriamente abalada. Com os dirigentes, por motivos óbvios e nem tão graves: tentou se valorizar ao máximo, contratou um dos agentes mais duros da NBA e volta com um contrato bem reajustado e flexível.

Com os colegas de time, deverá encontrar um clima pouco amistoso. Na semana anterior ao acordo, o brasileiro concedeu uma entrevista ao site ESPN.com, afirmando que estava ganhando bem menos do que outros atletas do elenco que não tinham conseguido em quadra um desempenho tão bom quanto o dele. Uma declaração obviamente mal recebida.

"Acho que ele constrangeu alguns de nós de um modo errado. Uma das coisas que você não faz nessa liga é comparar sua situação com a de outro, porque todos são diferentes. Quase não acredito que ele disse isso, porque antes ele havia dito que adora todos seus companheiros", afirmou um atleta do Cavs, sem ser identificado, ao diário "Plain Dealer", e citado pelo UOL.

Com a torcida, também deverá encarar um ambiente adverso. Se, na temporada passada, era um dos favoritos da galera - muitos torcedores vestiam nos jogos uma peruca simulando sua cabeleira -, agora precisará jogar muito para não ouvir vaias. O torcedor típico não entende que o atleta é profissional. Tem que jogar por amor ao clube. Se manifesta o desejo de sair, é mercenário. E a tendência é que o atleta, que perdeu a pré-temporada da equipe, leve tempo para entrar em forma.

Varejão volta às quadras em um outro patamar. Com mais dinheiro no bolso, mas também com muito mais responsabilidade. E não será recebido com sorrisos nos rostos (se surgirem, serão falsos). Terá que convencer dirigentes, colegas e torcedores. E até os árbitros, orientados pela liga a punir faltas cavadas, uma das especialidades do brasileiro. É um desafio. Uma nova novela começa.