sábado, 25 de agosto de 2007

Máquina do Mundo

“Mas as coisas findas, muito mais do que lindas, essas ficarão”



- É para escrever sobre o quê?
- Futebol e cultura.
- Excelente! Mas é aquela história do Quadrado Mágico...
- Qual?
- Tem tudo para dar errado.
- Vai para o ataque. Tenta.
- Vou começar com Drummond


Para o jornalista Armando Nogueira, se Drummond jogasse bola na seleção de escritores nacionais, ele seria um gênio. Daqueles que desafiam o impossível. Em seus versos, Carlos Drummond de Andrade ultrapassa limites. Craques assim agem.

Nos últimos meses mergulhei em um oceano desconhecido para a maioria: Drummond e o futebol. O amor do poeta e a paixão nacional. Alegrias e angústias do cronista nas copas do mundo. O resultado da pesquisa foi o programa “Drummond, de letra”, exibido pelo SporTV em 17 de agosto, dia de sua morte em 1987.

Atento observador do cotidiano, o poeta transformou futebol em obra-prima. Primeiro passo: olhar o esporte não como um cientista social repleto de teorias, mas como um admirador. Segundo passo: Enxergar momentos únicos. Instantes em que se produz automaticamente cenas eternas: um risco de Pelé, um rabisco de Mané, um Maradona, arisco.

“São vôos de estátuas súbitas, desenhos feéricos, bailados de pés e troncos entrançados. Instantes lúdicos: flutua o jogador, gravado no ar – afinal, o corpo triunfante da triste lei da gravidade”

Mineiro, mas torcedor do Vasco. Fã incondicional da Seleção brasileira. Acompanhou com entusiasmo as conquistas de 58, 62 e 70. Sofreu com as derrotas que castigaram o povo brasileiro após a Copa do México. Mesmo na derrota, um golaço: “Perder, ganhar, viver”, crônica sobre a tragédia do Sarriá, em 82 na Espanha. Derrota de Zico, Falcão, Sócrates e cia. A melhor Seleção de todos os tempos para muitos. E, para outros tantos, também o melhor texto esportivo já escrito. Drummond tirou, do momento de tristeza, um sorriso sublime.

“Certamente fizemos tudo para ganhar essa caprichosa Copa do Mundo. Mas será suficiente fazer tudo, e exigir da sorte um resultado infalível? E agora, amigos torcedores, que tal a gente começar a trabalhar, que o ano está na segunda metade?”

Para Drummond, o futebol é simples. Mas dessas simplicidades que fazem do homem comum o artista principal de seus próprios sonhos.

Após a exibição do programa, fui perguntado por algumas pessoas de onde foram retirados os textos sobre futebol. Se despertou a curiosidade, já valeu a pena. A cultura brasileira agradece. E fico um pouquinho envaidecido também ao ver que o jornalismo esportivo pode driblar um pouquinho as análises táticas. Pode, de vez em quando, se exibir como futebol-arte.

As obras de Carlos Drummond de Andrade sobre futebol estão reunidas na coletânea “Quando é dia de futebol”, da editora Record. O título da coluna, “A máquina do Mundo” é homenagem a um dos mais belos poemas do poeta. A legenda da foto são versos do Mestre.

Pedro Ribeiro não dispensa uma cerveja e um bom papo com os amigos, em qualquer dia e horário. Lê de Drummond a Paulo Coelho. Nas folgas, trabalha como coordenador de eventos no SporTV. Escreve sobre Esporte e Cultura aos sábados.

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