domingo, 16 de setembro de 2007

A luta das mulheres

Edinanci entrou com tudo e se saiu bem diante da tcheca (foto: divulgação)

Por Odisseu Kapyn

Na década de 80, o comediante americano Andy Kauffman – cuja impressionante biografia e hilariante carreira podem ser conferidas no filme “O mundo de Andy”, com Jim Carrey como protagonista -, deixou o público irritadíssimo, diria mesmo puto da vida, ao desafiar mulheres para confrontos de luta livre. Mesmo não sendo um grande esportista, ele sempre ganhava das moças. Kauffman chegou a oferecer um prêmio de US$ 1.000,00 para a mulher que conseguisse derrotá-lo.

Como ninguém o batia, ele mais tarde chegou a aumentar o prêmio, dizendo que se casaria com a fêmea que o derrotasse. Uma das coisas que mais deixavam o público com raiva era o fato de que o comediante – que, aliás, não gostava de ser chamado de comediante – costumava humilhar as oponentes no ringue, esfregando a cara delas na lona.

Quando soube dessa característica de Kaufman, já depois de sua morte, fiquei muito fã do sujeito. Quando eu era um jovem imberbe e imbecil, também tinha vontade de lutar com meninas, na época que praticava judô. Como eu não era lá muito sedutor, achava que teria mais chances de me engalfinhar com garotas se fosse no tatame. A adversária dos meus sonhos era a Jaqueline, que lutava de camisa Hering meio transparente por baixo do quimono. Mas não dava. Não só porque os professores do clube Mackenzie eram caretas, mas porque ela era mais velha, maior, não éramos da mesma categoria. Nunca tive coragem de chegar perto dela, convidá-la para tomar uma koka-cola, pois achava que ela ia me mandar wazari de perto dela.

Mas a vontade de lutar com mulheres foi crescendo. Ainda mais quando vi que não era um grande lutador. Imaginei que ao lutar com elas eu me sairia melhor, independente de qualquer segunda intenção erótica. No segundo grau, como continuava franzino, passei a desafiar mulheres para queda-de-braço. É incrível como as mulheres sonham vencer o homem fisicamente. Por mais femininas que fossem, topavam o desafio, achando que iam me vencer. Mas mesmo magro, um rapaz vence uma mulher normal. Sei lá por quê. Deve ser algum lance de fibras musculares mais resistentes. É o caso do Homem-Aranha, que mesmo sem ser musculoso dá porrada nos malfeitores.

Mas, mesmo com minha aparente supremacia, uma vez, no pré-vestibular, perdi na queda-de-braço pra uma colega de escola. Pedi revanche, e perdi de novo. Mas o saldo foi positivo para mim, pois no fim do ano letivo, peguei essa mesma menina. No sentido macho-fêmea, mesmo. Virei a luta. Ippon.

Isso tudo me vem à mente ao ver o Mundial de judô, realizado no Rio de Janeiro. Foi nessa competição que revi minha maior adversária em potencial, minha rival dos sonhos. Um dia ainda terei peito de lutar com Edinanci. Aliás, se ela tem peito, eu também posso ter. Devo confessar que a primeira vez que a vi, não me senti desafiado. Ela parecia com um amigo meu, que hoje é policial do Bope. Talvez por isso não tenha me atraído a atenção. Mas depois que ela se submeteu a duas cirurgias reparadoras, reparei mais em Edinanci. Passei a considerá-la uma adversária à altura, e que não tinha mais nada para me incomodar no contato físico mais forte propiciado pelo judô.

Nos Jogos Pan-americanos, o ouro de Edinanci despertou minha sanha competitiva. Pensei em voltar a treinar e desafiá-la. Só pediria para ela passar um batonzinho antes de entrar no dojô, pra eu me sentir mais seguro. Mas agora, no Mundial, passei a ter dúvidas se Edinanci realmente me ofereceria uma batalha digna. Sua performance me deixou decepcionado. Fiquei de olho em suas três últimas lutas. Contra a japonesa, minha rival se deu bem, o que deve ser considerado louvável, pois foram os nipônicos que inventaram o judô. Depois, Edinanci enfrentou uma tcheca. Sempre tive curiosidade em saber como ela se comportaria diante de uma tcheca. Ela entrou com tudo e se saiu bem. Eu faria o mesmo, se me permitem dizer.

Mas, no último confronto, Edinanci perdeu para uma lutadora da China, um país que está mais pro caratê e pro kung-fu do que o judô. Ora, Edinanci (sei que você lê o Por Esporte), como isso foi acontecer? Assim, nunca lutaremos, nunca terei a oportunidade de derrotá-la, de lhe passar um ashibarai (meu golpe preferido, pelo efeito fonético) e vê-la caindo atônita no tatame. Depois das Olimpíadas, a gente volta a pensar no assunto. Por enquanto, vou acompanhando o Mundial feminino de futebol. Do jeito que as meninas estão jogando, está me dando uma vontade danada de chamá-las pra uma pelada.

P.S. Acabou meu espaço e acabei esta semana sem falar de alguma prática que não deveria ser chamada de esporte. Na próxima coluna, devo seguir a dica do leitor Denis e discorrer o nado sincronizado. Como estamos aqui falando de competições femininas, vale repercutir o que o nobre internauta deixou nos “comentários” de minha coluna anterior, sobre a ginástica rítmica: “Outra prova de que tudo isso não é esporte é que as mulheres sempre querem assistir a tudo aquilo nas Olimpíadas. E desde quando mulher gosta de esporte?”.

Odisseu Kapyn troca os pés pelas mãos ao falar de lutas femininas. Ganhou fama no Cocadaboa. Hoje, escreve na Revista M e no blog Humor Marrom, e apresenta o Ponto Cômicos, grupo de comédia stand-up em cartaz no Rio. Faz suas gracinhas aos domingos.

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